20 novembro 2009

Coluna do Marcelo - Sonhadores de Deus - Segunda Parte

Seduziste-me Senhor e eu me deixei seduzir por Ti. (Jr. 20,7)

Foste mais forte que eu.

No artigo anterior falei do dom da escolha. Nesse pretendo encontrar o início, sim, o local, se o posso chamar assim, onde brotam os Sonhos de Deus em nossas vidas. Para isso temos que voltar um pouco na história e lembrar:

“No princípio, Deus criou os céus e a terra. A terra estava informe e vazia; as trevas cobriam o abismo e o Espírito de Deus pairava sobre as águas. Deus disse: "Faça-se a luz!" E a luz foi feita.” Gn 1, 1-3

Quando falei início, era início mesmo, afinal Deus possui a suprema sabedoria que a pequena mente humana jamais irá alcançar: “Para mim, tua sabedoria é grandiosa, alta demais, eu não a entendo”. (Sl 139, 6). Fiat, o mesmo faça-se a luz no momento da criação, era o mesmo Fiat de Maria; faça-se em mim a sua vontade. Ambos abriram caminho para as maiores transformações do planeta, a Criação e a Salvação. Só posso concluir então, que nossos Sonhos nascem de um Fiat, dado no momento mais sublime de nossa existência: “Ainda embrião, teus olhos me viram e tudo estava escrito no teu livro; meus dias estavam marcados antes que chegasse o primeiro”. (Sl 139, 16).

Foi no ventre de nossa mãe, doce manjedoura de nossa criação, que Deus plantou seus sonhos em nós. Mas, e meu direito de escolha? Onde fica então? Deus, nunca irá tirá-lo de nós, somos nós os únicos responsáveis por nossa salvação ou condenação. Cabe única e exclusivamente a nós decidir se transformaremos nossos sonhos em realidade ou não.

Confesso que, ainda hoje, mesmo tendo vivido e experimentado diversas situações, me sinto confuso, porém uma coisa é certa: “Felizes, sobretudo, são os que ouvem a Palavra de Deus e a põem em prática”. (Lc 11,28). Por mais que tentamos fugir da presença de Deus ou de seus sonhos, Ele sempre arruma um jeito de nos buscar. Ele nunca desiste de nós, mesmo que nós o rejeitemos e, quando nos deixamos conduzir por suas veredas, seus sonhos, experimentamos um amor e uma felicidade incomparáveis.

Vou fazer um breve resumo de minha história que, como a história de todo mundo a também poderia ser o roteiro de uma novela. O interessante, quando escrevemos sobre nossa vida é que conseguimos perceber a grande ação de Deus, presente em cada momento, em cada escolha.

Nasci em uma família católica. Meus pais me batizaram com dois meses de idade e nesse dia 24 de agosto de 1977, recebi a grande missão de todo cristão: Jesus, a partir do batismo, proclama e difunde a Boa Nova do Reino, não somente por meio de palavras, mas por meio de suas ações (Mc 4, 23-25). E, orientado pelos meus pais, iniciei minha caminhada na igreja, com a catequese e o crisma.

Sempre curioso e extremamente dinâmico, adorava participar dos encontros e estudar as leituras do domingo, para poder responder as perguntas do padre durante a missa das crianças. Esse envolvimento foi crescendo e tomando grande espaço em minha vida e, aos 15 anos de idade, senti o chamado a me consagrar a Deus, a viver a vida à luz do Evangelho.

Conversei com meu pároco na época e, ao terminar o Colegial comecei a participar dos encontros vocacionais da diocese. Porém, desde os encontros até hoje, sinto em meu coração que Jesus quer algo mais profundo de minha alma.

Prestes a entrar no Seminário, aos 18 anos de idade, enfrentei um dilema em meu coração. Como eu, que nunca havia trabalhado, sempre estudei, nunca trabalhei, poderia ajudar e aconselhar as pessoas? Eu sempre participei ativamente das atividades paroquiais, fui catequista, coordenador de grupo de jovens, sempre trabalhei na pastoral da liturgia. O desejo de ingressar era imenso, mas eu não queria fazê-lo sem ter uma bagagem, um conhecimento que pudesse usar no meu ministério.

Nessa época, entrei em contato mais profundamente com a história dos santos de nossa igreja. Personagens maravilhosos. A dedicação aos mais pobres e sua renuncia aos prazeres do mundo me conquistaram. Era isso que eu queria para minha vida.

Sempre estudei em colégios particulares e meus pais me deram a oportunidade de realizar diversos cursos, mas quando pude decidir, no colegial, resolvi entrar em uma escola pública e cursar o Magistério. Encantava-me a ideia de poder ensinar as crianças da periferia de minha cidade. Fiz estágio em escolas públicas e entrei para um grupo de teatro onde realizávamos apresentações para entidades de assistência aos carentes. Entre essas entidades, conheci pessoas que trabalhavam com crianças especiais (surdos, cegos e deficientes mentais). Identifiquei-me tanto com esse trabalho que sempre dizia a Deus que, se não fosse para entrar no seminário, ou em uma ordem que eu gostaria de cuidar de crianças assim.

Foi então, que percebi que meu chamado era para este modo de vida, ajudar e amar sem ter nada em troca. Decidi não entrar no seminário e ir para a faculdade estudar artes, me aprimorar nas artes cênicas e com meu conhecimento ajudar aqueles que mais precisavam: "Todo aquele que acolhe um destes pequeninos em meu nome é a mim que acolhe." (Mt.9,37).

Fiz então um pedido à Deus, que nesse período em que estivesse aprendendo que Ele me desse a oportunidade de experimentar tudo, assim como Santa Teresinha, queria escolher tudo, para que quando fosse o momento eu tivesse a "bagagem" que tanto almejava.

E Ele me ouviu.

“Não fostes vós que me escolhestes; fui eu que vos escolhi e vos designei, para dardes fruto e para que o vosso fruto permaneça. Assim, tudo o que pedirdes ao Pai, em meu nome, ele vos dará”. Jo 15,16


Postado por:

Luiz Marcelo Gonçalves

Vocacionado - São Paulo

03 novembro 2009

Coluna do Marcelo - Sonhadores de Deus

Crer é entregar-se.

Entregar-se é caminhar incessantemente em busca do rosto de Deus.

Escolhas, a vida é cheia delas, aliás, poderia dizer que a vida é “a escolha”. Sim, porque a cada minuto somos interpelados a continuar ou desistir, e o que fazemos simplesmente: escolhemos. Não pretendo, nessas poucas linhas, discursar sobre certos e errados, apenas sobre o maior dom recebido pelo homem. Dom que nem os anjos possuem: o livre-arbítrio, nosso dom de escolher.

Em muitos momentos na vida nos perguntamos o porquê das situações, das palavras, dos sofrimentos. Porque vim ao mundo? Teria eu uma missão? Qual? Onde? Acredito que essas respostas ressuscitarão conosco no último dia. Sim, talvez nunca nessa terra teremos certeza de nossas escolhas, apenas impressões do que elas causam em nossas vidas. Mas, uma coisa nos consola, não somos os únicos a sofrer pelas indecisões: "Resisti-lhe fortes na fé. Vós sabeis que os vossos irmãos, que estão espalhados pelo mundo, sofrem os mesmos padecimentos que vós. (1 Pd 5, 9)" Que alívio, não estamos ficando doidos afinal: “Deus escolheu o que é loucura no mundo para confundir os sábios”. (1 Cor 1, 27a)

Ao olhar a vida dos santos percebemos que eles, assim como nós sofreram todo tipo de indecisão, toda sorte de tribulação, e como nós tiveram que escolher. Mas onde se basearam suas escolhas? O que as sustentava, as motivava? O que fez as escolhas deles serem tão frutíferas a ponto de ultrapassar séculos e chegar até nós? Resposta: Sua Fé.

“A fé é a certeza daquilo que ainda se espera, a demonstração de realidades que não se veem”. (Hb 11,1)

No capítulo 11 da carta de São Paulo aos Hebreus, contemplamos o desfile de personagens de fé. Que viveram e morreram crendo. Mas, como explicar a fé, uma vez que ela deve, antes de tudo, ser vivida? Poderia então, com certa licença poética, dizer que ter fé é como sonhar. Ora, porque no sonho experimentamos sensações, emoções, que não se materializaram ainda. Os sonhos nos movem e nos animam a continuar. Seria então, um dos carismas daquele que tem fé, a vivificante capacidade de sonhar. Mas não sonhar qualquer sonho, qualquer desejo próprio e egoísta. Não! Ter fé é sonhar os sonhos de Deus, é deixar-se inebriar pela ação divina em nossa vida, que transformará o sonho em missão.

Pronto, resolvida então a primeira questão: qual a minha missão? Sonhar os sonhos de Deus.

Mas, esse pensamento gera outra pergunta: O que fazer desses sonhos? Teríamos nós a capacidade de interpretá-los e, mais ainda concretizá-los? Afinal, se o sonho de Deus é traduzido em missão e missão é ação, como eu, débil em habilidades posso receber tão preciso dom divino?

Uma pessoa fez isso e a partir dela tantas outras nos deram testemunhos do que é sonhar os sonhos de Deus e dar vida as maravilhas esperadas, alimentadas pela fé.

Maria, nossa adorável Mãe, com seu simples e humilde sim, sonhado e esperado por todas geração do Antigo Testamento, pelos juízes, reis e profetas. Pelo povo em desertos e exílios, prisões e cidadelas. A menina de Nazaré sonhou, acreditou, deu seu sim e caminhou. Sim, ela caminhou, afinal, qual foi sua primeira ação, imediata ao anúncio do anjo? Pôr-se a caminho até a casa de sua prima Izabel. Maria não apenas sonhou e aceitou, mas sua alma missionária pôs-se em ação.

Cheguei finalmente onde queria, em Maria a fonte inspiradora do viver evangélico, de transformação de vida a partir do compromisso de seguir Jesus. Claro, porque não existe sonho divino que não tenha sido revelado por Jesus. O que nós, sonhadores de Deus somos vocacionados a fazer, é nada mais nada menos, do que colocar em prática cada palavra, cada parábola, cada ensinamento presente na Boa Notícia. Assim como nós, Matheus, Marcos, Lucas e João sonharam em levar a boa notícia a todas as criaturas e de seus sonhos nasceram os evangelhos. Paulo, ao sonhar em levar Jesus aos pagãos transformou esse sonho em cartas e pregações. Isso ocorreu com São José, São Francisco de Sales, Santo Inácio de Loyola, São Caetano de Tiene, Santo Tomás de Aquino, São Vicente de Paula, São Luiz Gonzaga, São Filipe Néri, São João Berchmans e com o Pe. José Gualandi. Todos esses e muitos outros sonhadores de Deus souberam materializar e direcionar sua vida sobre sua missão, seu chamado, sua escolha.

Inauguro hoje essa coluna no Blog para contar experiências de sonhos e sinais de Deus, em minha vida e na vida de outras pessoas, contemporâneas a nós, sonhadoras que, como nós, buscam viver o evangelho, essa difícil e doce tarefa no seu dia-a-dia. Conto com a ajuda de todos, afinal um sonho sonhado junto se torna realidade. E é justamente por esse caminho que inicio a coluna, contando como o sonho do Pe. José Gualandi tornou-se o meu sonho. Como meus sonhos encontraram nos sonhos dele um motivo, um objetivo, uma Missão. Uma pequena missão, onde tantos outros como eu creem, e crendo entregam-se ao caminho e no caminho à missão de buscar o rosto de Deus no rosto dos irmãos.

"Este Jesus vós o amais, sem o terdes visto; credes nele, sem o verdes ainda, e isto é para vós a fonte de uma alegria inefável e gloriosa, porque vós estais certos de obter, como preço de vossa fé, a salvação de vossas almas."( 1 Pd 1, 8 )



Postado por:


Luiz Marcelo Gonçalves

Vocacionado - São Paulo